quarta-feira, 22 de junho de 2011


Leonina



Muita graça, nessa figurinha em miniatura, que se pinta, se veste e quer com uma força bem maior que essa “luta” ser uma espécie que a ela não pertence o “ser”.
E é um pintura tão “completa” que ninguém consegue perceber, só eu, infelizmente, consigo vê a tinta derretendo ali no cantinho atrás da orelha. Não posso nem gritar, nem apontar aquele “deslize” porque os que estão ao seu redor não conseguem perceber e por mais que eu aponte não adianta, estão cegos.
Sinto algo como piedade por esses seres e quase no mesmo instante algo como desprezo e asco, mais até que por ela, essa criatura forjada. Porque eu sei que um dia eu ou outra , que também enxergue a tinta ali escorrendo, vai fazer o trabalho de “limpeza” com ácido, aí nem tinta, nem pele, nem músculo estarão presentes, só os ossos e sangue escorrendo.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

A arte de ser feliz




Houve um tempo em que minha janela se abria
sobre uma cidade que parecia ser feita de giz.
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.
Era uma época de estiagem, de terra esfarelada,
e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde,
e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.
E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor.
Outras vezes encontro nuvens espessas.
Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro.
Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais.
Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar.
Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.
Ás vezes, um galo canta.
Às vezes, um avião passa.
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros,
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.


Cecília Meireles